28 de junho de 2011

LAMA MICHEL /

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9 de junho de 2011

Tratado de Ateologia – Michel Onfray
By
Hypnos
– 29 de junho de 2009Posted in: Resenhas

O Tratado de Ateologia de Michel Onfray é um ponto de referência do ateísmo contemporâneo. Publicado em 2007 pela editora Martins Fontes, a obra oferece argumentos relevantes que colocam o modo de vida do crente em questão. Desta maneira, não se trata de uma tentativa de provar objetivamente a não existência de Deus, mas destacar que as três grandes religiões monoteístas negam esta vida, desprezam o corpo e alimentam o sofrimento como barganha para um mundo no além. “Em nenhum lugar desprezei aquele que acreditava nos espíritos, na alma imortal, no sopro dos deuses, na presença dos anjos, nos efeitos da prece, na eficácia do ritual, [...]. Mas em toda parte constatei quanto os homens fabulam para evitar olhar o real de frente. A criação de além-mundos não seria muito grave se seu preço não fosse tão alto: o esquecimento do real, portanto a condenável negligência do único mundo que existe.” Onfray, fundador da Université Populaire de Caen, onde ministra suas aulas de filosofia, destaca, no início da obra em questão, uma citação do Ecce Homo de Nietzsche na qual o filósofo alemão declara que a noção de Deus é uma invenção e, além disso, criada como antítese da vida. É a vida, com todo seu esplendor e ímpeto trágico, que Onfray quer apresentar ao seu leitor.
A religião – conceito que engloba as três religiões monoteístas – esconde a verdade sobre o mundo, ou seja, um mundo cruel que obriga o homem a suportar tanto a existência, com todos os seus dilemas e dúvidas, assim como a morte, enquanto figura trágica a qual todos os homens já estão condenados. O homem, não enfrenta o(s) problema(s), mas se esconde atrás de máscaras da imortalidade produzidas pela religião: “[...] o crente, ingênuo e tolo, sabe que é imortal, que sobreviverá à hecatombe planetária…” Este saber, destacado por Onfray, foi, é e será, sempre alimentado por aproveitadores. Estes promovem um “comércio de além mundos” que concede segurança ao crente; tais comerciantes organizam uma espécie de tráfico metafísico para aqueles que precisam “reforçar sua necessidade de socorro mental.” O tráfico tem como motor a demanda do rebanho. Mas que demanda é esta? Vivemos, destaca Onfray, um tempo de “niilismo, o culto do nada, a paixão pelo nada, o gosto mórbido pelo noturno dos fins de civilizações, o fascínio pelos abismos e pelos buracos sem fundo em que se perde a alma, o corpo, a identidade, o ser e todo o interesse por o que quer que seja. Quadro sinistro, apocalipse deprimente…”, mas a crença em Deus ainda é, para grande maioria, um sinal de grande esperança. Logo, o homem espera um algo que nem se pode constatar a existência, no entanto, enquanto há esperança em Deus encontramos todos os sintomas de uma humanidade lançada em um vale de lágrimas. Mas como sair deste estado? “Uma ficção não morre, uma ilusão infantil não espira nunca, não se refuta um conto infantil.” Onfray revela a dificuldade de refutar a religião, o medo de alguns filósofos que estiveram neste limiar e, aturdidos pelo abismo metafísico, deram um passo para trás: “Deus mata tudo o que lhe resiste.” Assim, o homem está longe daquilo que o escritor chama de progresso ontológico. Deus ainda é objeto de muita “tagarelice de seus ministros”, de modo que a partir destes discursos em nome de Deus se constrói o conceito de ateu: o ateu é aquele que não acredita naquilo que eu acredito. Os efeitos são uma classificação crítica que promove uma filosofia oficial e uma filosofia não-oficial: “Quem, para falar apenas do ‘Grand Siècle’, leu Gassendi, por exemplo? Ou La Mothe Le Vayer? Ou Cyrano de Bergerac – o filósofo, não a ficção…? Tão poucos… E no entanto Pascal, Descartes e Malebranche e outros detentores da filosofia oficial são impensáveis sem o conhecimento destas figuras que trabalharam pela autonomia da filosofia com relação à teologia – no caso a religião judeo-cristã…”. Onfray destaca a possibilidade de rever a história da filosofia a partir de autores considerados marginais por grande parte dos historiadores da filosofia e, por este motivo, já escreveu três volumes de uma obra denominada Contra-História da Filosofia, de modo que os dois primeiro volumes foram traduzidos para a língua portuguesa e publicados em 2008.
Enfim, o Tratado de Ateologia de Michel Onfray é uma obra forte, pelos argumentos esboçados, desejosa, por fazer brotar a verdade da existência com suas penúrias e sofrimentos impossíveis de suprimir, sincera, por trazer à luz as idéias de sua reflexão pessoal sem o medo dos padrões institucionais determinantes, dramática, pela visão trágica do mundo, do homem e de Deus e, enfim, devota, pelo número de leitores que buscam nesta obra uma ofegante fundamentação teórica do próprio ateísmo.
ONFRAY, Michel. Tratado de Ateologia. São Paulo: Martins Fontes, 2007, 214 p.
Andrei Venturini Martins